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Estudo do texto - 8º ano

Penka e o feiticeiro medonho 

 Numa caverna da montanha, lá onde planam as brumas acinzentadas que levam a chuva aos bosques do vale, vivia, desde tempos imemoriais, um feiticeiro muito malvado. Os índios tinham medo dele, porque ele havia se mancomunado com os gualiris – os maus espíritos –, e, quando lhe dava vontade, ele os mandava às aldeias para que levassem, quer uma doença incurável, quer uma colheita ruim, ou a má sorte na caçada. Nessas condições, é compreensível que os habitantes da aldeia levassem ao feiticeiro, na montanha, tudo o que tinham de melhor. Mas ele não se contentou. Acabou pensando que poderia se casar com a mais bela das moças índias. Naquela manhã, portanto, uma fumaça negra saiu da caverna e os gualiris clamaram a todos os ecos a vontade do feiticeiro. Seus gritos ecoavam de pedra em pedra, de rocha em rocha, de vale em vale, e as montanhas tremiam. - Antes do cair da noite de amanhã, trazei, para ser minha noiva, a vossa mais bela moça. Senão estão fritos. - Estão fritos, estão fritos, repetia o eco. Os índios eram obrigados a obedecer a ordem do feiticeiro. Mas qual deles tinha vontade de dar sua filha a um velho, feio como os sete pecados capitais? E, ainda por cima, tinha de ser a mais bela moça e todos sabiam quem era aquela que ninguém superava em beleza: Penka, a órfã. Era uma jovem que, desde a mais tenra infância, tivera de se sustentar sozinha, pois seus pais haviam morrido muito moços. Mas Penka não ficara lamentando a sua infelicidade. Muito cedo, fora capaz de revolver uma lavoura tão bem quanto sua mãe o fazia, de levar as lhamas para pastar, e, quanto ao tiro com arco, poderia fazer qualquer dos caçadores mais hábeis passar vergonha. Quando ela cresceu, a essas qualidades de boa trabalhadora veio se acrescentar uma grande beleza. Por tudo isso, e não é de estranhar, os habitantes das aldeias a estimavam, e todos os moços tinham vontade de casar com ela. E, agora, teriam de entregá-la ao medonho feiticeiro da montanha? - Nunca, nunca, preferimos sofrer todos!,- clamaram eles, mas a própria Penka lhes disse: - Não tenham nenhum receio por mim. Está na hora de finalmente o feiticeiro parar de nos atormentar. Quem, melhor do que eu, poderia chegar a esse resultado, sendo sua mulher. Deixem-me partir para a montanha e, se eu me sentir em perigo, eu mesma os avisarei. Ela persistiu na sua resolução, mesmo quando eles discutiram para tentar encontrar uma outra solução. Assim, na manhã seguinte, a jovem reuniu os seus poucos pertences numa cesta, colocou a cesta nas costas, e foi-se embora. Nas montanhas cheias de bruma, há muitos caminhos e atalhos, e, em cada um deles, há um gualiri espreitando os viajantes e tramando entre si suas peças de mau gosto. Mas desta vez o feiticeiro avisara todos eles: - Se virem uma moça que vem sozinha, não toquem sequer num fio de cabelo dela, e tragam-na até mim. Assim Penka chegou bem depressa e sem dificuldade à caverna. O feiticeiro a aguardava, e se enfeitara o melhor que podia; mas, mesmo assim, ao vê-la, ela tremeu de asco. Das peles preciosas saíam longos dedos curvados como garras; do seu crânio calvo saíam, bem retas, duas orelhas de rato. Na pele do rosto, granulosa e esverdeada como a de um lagarto, escondiam-se olhos de peixe, muito redondos. Quanto ao nariz, daria um lindo bico de coruja, e seu corpo atarracado mais parecia uma abóbora do que um corpo humano. - É bom que tenhas vindo, pois um triste destino aguardava todos os índios, resmungou o feiticeiro à sua visitante. - Como assim, velho? perguntou Penka, bem depressa. - É meu segredo; quanto a ti, seria melhor cuidares da comida e da bebida para o banquete de núpcias, respondeu o feiticeiro com brutalidade. Se precisares de algo, os gualiris te trarão. Depois disso, ele se deitou na frente da gruta e, um minuto depois, roncava muito alto. Penka pôs mãos à obra imediatamente. Mandou os gualiris buscarem lhamas, leitões, milho, mandioca, abóbora, feijão, batata, írutas, em resumo tudo aquilo que lhe veio à cabeça, e principalmente não se esqueceu de uma quantidade considerável de bebida. Exaustos, gualiris corriam para cá e para lá e a jovem os repreendia tanto quanto podia: este trazia demais, mas aquele não trazia o suficiente; que fossem logo cozinhar a carne, e esse milho é preciso fazer farinha com ele agora mesmo; enfim, eles tiveram de correr tanto que tiraram inteiramente da cabeça o hábito de pregar peças. Quando tudo ficou pronto para o banquete, o velho feiticeiro acordou. - Estou vendo que a noiva que me mandaram não é apenas bela, mas é também uma boa trabalhadora, disse ele satisfeito, e foi logo se acomodando à mesa. Leitões inteiros, cestadas de bolos, sem esquecer jarras cheias de vinho, desapareceram num piscar de olhos na sua insaciável pança. Penka mal conseguia lhe passar os pratos. De vez em quando, ele atirava alguns restos aos gualiris, que estavam lá mendigando, mas somente um feiticeiro malvado podia se empanturrar do modo como ele fazia... Ora, Penka sabia o que queria, quando tinha temperado tão generosamente com especiarias a sua comida. O velho tinha de beber depois de cada bocado, e, em pouco tempo, acabou ficando completamente bêbado. Começou a se gabar de ser um grande feiticeiro, muito poderoso. Quanto mais bebia, mais exageradamente contava vantagens. - Meu poder é sem limites porque eu sou imortal, afirmava ele. Posso matar os índios, posso matar o sol ou a lua, se me der na telha... A moça fez uma cara de dúvida, e disse: - Gostaria muito de ver isso! -Ah, gostarias muito de ver isso? Os gualiris os trariam até aqui, e eu os precipitaria no abismo da caverna. E, se eu assim quisesse, eles ficariam lá para sempre... ! - Vem ver com os teus próprios olhos! O feiticeiro se levantou e, todo cambaleante, levou a moça até a caverna. Na entrada, tiveram de transpor um grande amontoado de blocos enormes. Penka disse: - Por que colocaste pedras aqui? - Ah! Mas essas não são pedras comuns. Quando eu construir um muro com elas, nem a menor formiga conseguirá atravessá-la. E eu ia construir esse muro para os teus vizinhos da aldeia, e eles nunca mais tornariam a ver a luz do dia, se tivessem deixado de te mandar para mim. Quando transpuseram o monte de pedras, Penka viu o abismo, tão profundo que a luz não chegava até o fundo. O feiticeiro riu: - Sabes, eu teria jogados todos eles todos eles lá dentro. Há uma fenda que vai até o centro da Terra. Penka não queria se aproximar demais do abismo. O feiticeiro, por causa de toda a comida e do vinho que havia engolido, sentiu necessidade de descansar. - Preciso fazer uma pequena sesta, uma pe-que-na ses-ta, gaguejou ele, e na mesma hora caiu num sono de chumbo. A moça ficou ali por um momento, olhando para ver se ele não ia acordar; depois, reunindo toda sua força, ela o empurrou, o fez rolar até o abismo, até o corpo dele passar por cima da borda. Ele foi atirado e caiu até chegar ao centro da terra. Demorou um bom tempo para Penka ouvir um ruído surdo: em seguida, ela tornou a ouvir, vindo das profundezas, o ronco que já conhecia. O feiticeiro não havia perdido a vida. - Tenho de me apressar antes que ele acorde, pensou Penka. Ela pulou sobre o monte de pedras e começou a construir um muro. Suas mãos hábeis e pequeninas voavam. Ela prendia cuidadosamente as pedras umas sobre as outras. Em pouco tempo, tapou a caverna até o teto. Assim, caso o feiticeiro conseguisse escalar a parede do abismo, não conseguiria chegar à luz do sol. Depois a moça correu ousadamente para o vale e sua aldeia. Não tinha mais nada a temer; os gualiris a chamavam para que ela voltasse atrás, mas ela já não tinha medo deles. Quando Penka contou aos índios como tinha se livrado do feiticeiro, sua alegria não teve limites. Daquele dia em diante, tiveram ainda em mais alta estima aquela moça, inteligente e corajosa, e sempre acataram seus conselhos. Quanto ao feiticeiro, ele continua a viver no seu abismo, mas bem que gostaria de sair de lá. Às vezes, durante dias, bate nas paredes, a toda, ruge, e um terremoto sacode as montanhas. Os gualiris levam o eco bem longe pelos arredores. Contos da América Latina – Editora Paulus

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