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A prática docente na era da globalização 4

A PRÁTICA DOCENTE, ENFRENTANDO OS DESAFIOS DO SABER, FAZER E DO PODER
Abril de 2003

O professor como transmissor de conhecimento desaparece para dar lugar à figura do mediador. A negação da imagem do professor como mero repassador de informações, já presente em Dewey, em Anísio Teixeira e em Paulo Freire, é retomada no paradigma emergente, que parte do princípio de que na era da Internet, o professor não é a única e nem a mais importante fonte do conhecimento. O indivíduo é bombardeado de informações a todo o momento e através de diversas fontes. Cabe ao docente, mais do que transmitir o saber, articular em que o aluno reflita sobre suas relações, com o mundo e o conhecimento, assumindo o papel ativo no processo ensino-aprendizagem que, por sua vez, deverá abordar o indivíduo como um todo e não apenas como um talento a ser desenvolvido. O desafio está portanto na incorporação de novas tecnologias a novos processos de aprendizagem que oportunizem ao discente atividades que exijam não apenas o seu investimento intelectual, mas também emocional, sensitivo, intuitivo, estético etc, tentando não simplesmente desenvolver habilidades ( Dewey, Anísio Teixeira ), mas o indivíduo em sua totalidade.
De acordo com o novo paradigma, a própria noção de conhecimento deve ser revista. O conhecimento não é algo acabado nem definitivo. Conforme leis da Física Quântica, mesmo os objetos não relativos, posto que inclui o olhar do observador ( a quarta dimensão do objeto ). Assim, a realidade quântica jamais será observada duas vezes da mesma forma. Isso torna os conceitos relativos, e a realidade será sempre um modo particular de percepção do mundo e das coisas, não havendo verdades perenes, mas verdades relacionais e portanto transitórias.
Toda percepção, todo conceito, toda observação leva em conta o olhar do observador, de modo que a própria realidade se relativista, no sentido de que será uma vivência única para cada indivíduo. Isto considerado, ao invés de centrar nos conceitos, o novo paradigma sugere que a escola privilegie as relações, dando maior importância não ao resultado, mas ao processo, não à funcionalidade do aprendizado, mas à auto-realização, à auto-estima.
Essa nova prática exige ambientes que extrapolem o espaço da sala de aula, ocupando de modo mais assíduo não apenas os laboratórios e os espaços sociais da escola, como também os disponíveis na Comunidade, realizando atividades colaborativas em que as experiências sejam vivenciadas individualmente e em grupo, atividades que privilegiem a dinâmica de projetos, que invistam o aluno de responsabilidades reais, antes o seu aprendizado e o mundo que o cerca, atividades que sejam avaliadas, mais do que por uma avaliação de conteúdos, pela auto-realização que elas proporcionem. Neste contexto, o aulismo passa a ser coisa do passado, abrindo caminho para a pedagogia do "estar no mundo". A sala de aula deixa de ser o templo de transmissão e da repetição do saber para sediar importantes momentos de socialização do aprendizado individual e de experiências em grupo, do diálogo e do confronto entre essas experiências e a teoria, da formulação de problemas e da busca de soluções.
O que se propõe é uma escola em que o aluno se veja participante de uma Comunidade, em que ele perceba sua futura profissão como instrumento de presença no mundo. É importante ressaltar que a Escola Nova e a Tecnicista já propunham esses objetivos.
O novo paradigma delineia uma utopia que envolve não apenas o indivíduo, mas o grupo, aqui entendido não apenas como a Comunidade, o grupo étnico, a nação, mas o globo. Em termos de estratégias de ensino, o novo paradigma sugere, de um lado, a diminuição da importância das aulas expositivas ( dissertativas, diria Paulo Freire ) e , de outro, a intensiva imersão do futuro profissional na Comunidade.
No primeiro caso, é necessário repensar o uso de materiais didáticos que, embora agradáveis e visualmente atrativos, podem estar apenas reforçando a escola tradicional, alertando o docente para a necessidade de se escolher o material didático do ponto de vista do seu efeito no aprendiz : evidentemente recursos que exijam do aluno uma situação passiva, de "receptor", diante de um conteúdo a ser aprendido não podem ser considerados desejáveis no contexto ensino-aprendizagem que privilegie a construção do saber. Os professores devem estar alerta em relação à utilização dos recursos de mídia e hipermídia nas escolas, lembrando que o uso das tecnologias modernas de informática não podem desencadear por si só uma nova postura diante do processo ensino-aprendizagem. Transcrevendo as palavras de Morais, "Programas visualmente agradáveis, bonitos e até criativos podem continuar representando o paradigma instrucionista ao colocar no recurso tecnológico uma série de informações a ser repassada ao aluno" ( op.cit, p. 16 ), reafirmando e expandindo a velha pedagogia do repasse de conhecimentos.
No segundo caso, surge que a escola promova o desenvolvimento das várias faculdades ( e não apenas a intelectual ) do aluno, de modo que em sua ação futura, como profissional, não veja o outro ( o paciente, o cliente, o aluno etc ) como apenas um "receptor" de um determinado conhecimento, mas como uma pessoa completa, com necessidades, com problemas etc. É preciso que o indivíduo perceba o outro não como seu inimigo, como um competidor, mas sobretudo como extensão de si mesmo, pois como escreve Danah Zahar, em Sociedade quântica ( São Paulo, Best Seller, 2000, p. 254 ), nos termos da nossa natureza quântica há uma necessidade mútua entre o meu e os outros, dos quais preciso para ser simplesmente eu. Quanto mais liberdade e direitos eu tiro do outro mais limitados serão meus direitos e minha liberdade.
O novo paradigma de nada nos adiantará se não formos capazes de traduzi-lo em currículos engajados socialmente com o futuro do país, o que significa planejar uma educação que possa resgatar no brasileiro não apenas seu amor próprio, como também o sentimento de responsabilidade social. Entretanto essa não é uma tarefa simples, pois, como lembra Maria Cândida Morais, a nova educação exige que o indivíduo faça.
Uma educação que vise mudar comportamentos é revolucionária, requer mudanças profundas no modo de pensar e agir das pessoas. Paulo Freire, ao discorrer sobre a educação libertária dos oprimidos, também alerta para as dificuldades de se mudarem comportamentos arraigados. Para ele, tanto o opressor quanto o oprimido tem medo da liberdade. Ao problematizar-lhes uma situação concreta, começa a ser colocado em frente à sua realidade dual, o que incomoda e os leva a lutar contra a liberdade. A partir de suas experiências como educador ( não o que instrui, mas o que coordena o processo de aprendizagem ), Freire faz a seguinte observação sobre a resistência dos educandos :
" Desnudar-se de seus mitos e renunciar a eles, no momento, é uma ‘violência’ contra si mesmos, praticada por eles próprios. Afirmá-los é revelar-se. A única saída, como mecanismo de defesa também é transferir ao coordenador o que é a sua prática normal : conduzir, conquistar, invadir, como manifestacões de sua antidialogicidade" ( op.cit., p. 182-3 )
Enfrentar essa realidade no contexto escolar tem significado para alguns uma luta hercúlea e infrutífera contra currículos, diretores, coordenadores, colegas e, muitas vezes, os próprios alunos. Se essa é uma tarefa que está longe de ser simples, por outro lado também não é impossível. É preciso entretanto que ela seja planejada em termos de escola, numa discussão ampla que envolva todos, do diretor ao aluno.
Agora que está em moda repensar os currículos, construir os projetos pedagógicos, não é esperar demais que os docentes, em seus mais diversos níveis, parem para refletir sobre os impactos dos valores do mundo globalizado nas mais diversas áreas do conhecimento e que, a partir disto comecem a conceber uma prática em que o aprendiz, como totalidade, esteja no centro do processo ensino-aprendizado e em que o projeto pedagógico delineie (ou pelo menos insinue) um projeto de país, que possa ser aplicado a um bairro, a uma cidade ou uma região.

Referência desta reflexão : http:/www.pedagogiaemfoco.pro.br/prof04.htm

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